Manifestação pública: 91 organizações unidas contra o homeschooling
Publicado em 05/12/2025 12:10, por Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

Senhores e Senhoras Parlamentares,
Vimos por meio deste manifestar nossa profunda preocupação com a série de projetos de lei (PL 1338/2022; PL 3262/2019; PLP 22/2022; PLP 118/2025; PL 6029/2025, dentre outros), emendas e destaques (Destaque 3 apresentado ao PL 2614/2024 – Plano Nacional de Educação) em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal que dispõem sobre a possibilidade de oferta do ensino domiciliar na Educação Básica, também conhecido como homeschooling.
Rogamos que essas propostas legislativas sejam integralmente rejeitadas pelos motivos abaixo expostos:
O tema do ensino domiciliar é extremamente polêmico, carece de consenso e traz grande impacto para a proteção integral de bebês, crianças e adolescentes. O avanço dessa matéria pode ampliar desigualdades educacionais, dificultar a identificação de situações de abuso, negligência e violação de direitos, além de reduzir o espaço de fiscalização do poder público na garantia da prioridade absoluta de bebês, crianças e dos jovens.
A escola exerce papel essencial na educação e na proteção, convivência e detecção de riscos. Neste último, a escola é o ambiente mais efetivo do Sistema de Garantia de Direitos, identificando de forma sistemática violências e violações. Dados do Ministério da Saúde (Atlas da Violência 2025) indicam que a violência doméstica representa 67,8% dos casos entre crianças de 0 a 4 anos, 65,9% entre 5 e 14 anos e 48,4% entre 14 e 19 anos, sendo os familiares os principais agressores.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025, os registros mostram que 69,1% dos estupros/estupros de vulnerável com vítimas menores de 14 anos ocorreram na residência da vítima; quando há informação sobre a relação autor–vítima, 59% dos estupros de menores de 14 anos são cometidos por familiares.
Diante desse cenário, a escola desempenha papel central na identificação de violações físicas, sexuais e psicológicas, tornando-se um importante e eficiente espaço protetivo. Mesmo que a criança ou adolescente não peça ajuda explicitamente, a violência pode ser percebida por marcas físicas, por mudanças de comportamento e outras formas de expressão.
Mas não é só, é também na escola que crianças e adolescentes, muitas vezes, têm sua alimentação garantida, desempenhando um papel fundamental na garantia dos direitos básicos. Diariamente, as escolas públicas do Brasil alimentam 40,3 milhões de crianças e adolescentes (Sisvan, 2021), o que torna a frequência escolar um componente estruturante do acesso à alimentação.
É na escola que as crianças interagem com outras crianças, criam laços, desenvolvem habilidades sociais e exploram todo o seu potencial. A escola não é apenas um local de aprendizado de um conjunto de saberes científicos, mas também um espaço de construção partilhada de sentidos e de vivência de práticas sociais e culturais fundamentais para uma educação cidadã e democrática.
É na escola, com a ampliação da rede de relacionamentos para além do núcleo familiar, que as crianças têm a oportunidade de vivenciar a diversidade, a partir da interação com colegas, mediada por profissionais qualificados(as), e enriquecer o seu aprendizado para além das ciências e das humanidades.
É na escola que se aprende o exercício da alteridade. É o espaço onde crianças podem criar vínculos com outras diferentes delas, de diversos contextos, origem, cores, raças e deficiências. Nesse sentido, o fortalecimento de um sistema educacional inclusivo beneficia a diversidade que compõe a sociedade.
É também na escola que as crianças com deficiência, antes isoladas em espaços privados, exercem o seu direito constitucional, conquistado com muita luta, de aprender e se desenvolver na convivência com seus pares com e sem deficiência.
O homeschooling, portanto, fragiliza o papel da escola na promoção do desenvolvimento infantil, da equidade educacional e da inclusão social. Defendemos que a prioridade do Estado seja fortalecer o ambiente escolar.
Além disso, não há evidências científicas robustas de que a oferta do ensino domiciliar promova desenvolvimento social e econômico para um país. Por outro lado, temos um arcabouço exaustivo de pesquisas que mostram a escola como propulsora de capital humano. Quando se trata de direitos básicos de bebês, crianças e adolescentes, não podemos fazer experimentos. O que temos certeza é sobre a importância da escola como fator fundamental para aumentar a riqueza, quebrar ciclos intergeracionais de pobreza e diminuir as desigualdades de um país.
O Brasil tem avançado em políticas públicas para a educação. No entanto, ainda há muito a ser conquistado. Neste momento, precisamos concentrar nossos esforços na melhoria da qualidade e do acesso, conforme Artigo 206 da Constituição, e encontrar soluções para os desafios que já conhecemos, como os baixos salários de professores(as), a falta de infraestrutura e a superlotação das salas de aula.
O homeschooling vai na contramão dos avanços da educação brasileira, que incluem a expansão da educação em tempo integral e o combate à evasão escolar. Além disso, representa matéria de grande impacto para os entes subnacionais por conta da criação de obrigações hoje inexistentes na organização da educação pública, inclusive no Sistema Nacional de Educação recém aprovado e nos mecanismos de financiamento da educação de nosso País.
Pais, mães e responsáveis podem – e devem – se envolver com a vida escolar de seus filhos e filhas, participar das decisões cotidianas da escola e contribuir com as melhorias que tanto precisamos. Famílias e escolas têm responsabilidades distintas na formação de crianças e adolescentes – e que não se anulam, pelo contrário, se completam, conforme previsto no Artigo 205 da Constituição. A solução é, e sempre será, fortalecer a escola, como promotora de educação, proteção e desenvolvimento integral para crianças e jovens.
Expressamos nossa firme oposição diante da possibilidade de aprovação do homeschooling confiantes de que os senhores e senhoras parlamentares defenderão os direitos das crianças e adolescentes com prioridade absoluta. Contamos com a atuação decidida de seus mandatos rejeitar integralmente a aprovação do homeschooling em nosso País em quaisquer iniciativas legislativas.
Parlamentar, diga NÃO ao homeschooling!
SIGNATÁRIOS
Agenda 227
ANDI – Comunicação e Direitos
Associação Beneficente Santa Fé
Associação Canários Senzala
Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas (Abraça)
Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon)
Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (Anec)
Autistas Brasil – Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas
Avante – Educação e Mobilização Social
Centro de Criação de Imagem Popular (Cecip)
Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec)
Centro de Investigações sobre Desenvolvimento Humano e Educação Infantil (Cindedi)
Centro Lemann de Liderança para Equidade na Educação
Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Childhood Brasil
Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva
Coalizão Brasileira pelo Fim da Violência contra Crianças e Adolescentes
Coletivo a Vez e a Voz das Crianças
Coletivo Mães Eficientes Somos Nós
Conselho Municipal de Educação de Vitória (Comev)
Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems)
Contee
CPPL – Clínica, Ensino e Consultoria em Gestão
Curió – Grupo de Pesquisa sobre Crianças, Educação Infantil e Cotidiano Pedagógico
Equidade.Info
Escola de Educadores
Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (Fbasd)
Federação Paranaense de Associações de Síndrome de Down (Fepasd)
Fórum de Educação Infantil de Porto Alegre (Feipoa)
Fórum Permanente de Educação Inclusiva do Espírito Santo
Fórum Permanente de Educação Infantil do Espírito Santo
Fórum Regional de Educação Infantil do Alto Uruguai Gaúcho
Fundação Itaú
Fundação Lemann
Fundação Lucia e Pelerson Penido (FLUPP)
Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal
Fundação Tide Setubal
Fundação Van Leer
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)
Gitaka UniRio – Grupo Infâncias, Tradições Ancestrais e Cultura Ambiental
Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Primeira Infância – Geppi
Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife)
Grupo Mulheres do Brasil
Infinis – Instituto Futuro é Infância Saudável
Instituto Alana
Instituto Ambikira
Instituto Avisa Lá – Formação Continuada de Educadores
Instituto Ayrton Senna
Instituto C – Criança, Cuidado, Cidadão
Instituto Dara
Instituto da Infância (Ifan)
Instituto Desiderata
Instituto de Estudos da Religião – Iser
Instituto Fazendo História
Instituto Igarapé
Instituto Jô Clemente
Instituto Liberta
Instituto Mari Johannpeter
Instituto Natura
Instituto Obeci – Observatório da Cultura Infantil
Instituto Reuna
Instituto Rizomas
Instituto Rodrigo Mendes
Instituto Sou da Paz
Instituto Stella Goulart
Instituto Tecendo Infâncias
Instituto Unibanco
Iser – Instituto de Estudos da Religião
Laboratorio de Educação (Labedu)
Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação e Economia Social (Lepes)
Lekto
Mais Diferenças
Movimento Bem Maior
Movimento Paratodos
Movimento pela Base
Movimento Profissão Docente
Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI)
Parceiros da Educação
Palhaços Sem Juízo
Plan International Brasil
Rede Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Rede-In)
Rede Nacional Primeira Infância (RNPI)
Recria – Rede de Pesquisas em Comunicação, Infâncias e Adolescências
Roda Educativa
Secretaria de Inclusão Acadêmica e Acessibilidade da Universidade Federal do Espírito Santo (Siac/Ufes)
Tempojunto
Todos Pela Educação
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime)
União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação – Seccional Pernambuco
Usina da Imaginação
United Way Brasil (UWB)