Setembro Amarelo: os impactos do estresse tóxico na primeira infância

O cuidado com a saúde mental de bebês e crianças nessa faixa etária deve ser prioritário, assim como o apoio aos cuidadores

Published on 17/09/2025 02:51, by Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal

Um bebê deitado em uma superfície macia, vestindo um macacão branco com pequenas estampas coloridas. Um adulto segura delicadamente os pés do bebê com as duas mãos, transmitindo cuidado e carinho. Ao fundo, há uma manta e parte de um travesseiro rosa com desenho de rosto sorridente. A imagem está relacionada aos cuidados de prevenção ao estresse tóxico

Quando surge de forma controlada e com acolhimento adequado dos adultos, o estresse pode ser um fator importante no desenvolvimento infantil. Mas quando as tensões se tornam contínuas e intensas, sem proteção e apoio dos cuidadores para lidar com elas, o estresse pode se tornar tóxico.

Quando vivenciado nos primeiros seis anos de vida, a primeira infância, seus efeitos podem se estender por toda a vida. Isso produz diferentes impactos, prejudicando a memória, a aprendizagem e a regulação emocional, além de afetar a construção da confiança, da autonomia e de vínculos seguros com o mundo.

Observar e cuidar da saúde mental dos cuidadores é igualmente importante: a sobrecarga emocional pode reduzir a capacidade de oferecer as relações de apoio de que as crianças precisam para se desenvolver e a criação de ambientes emocionais seguros — essenciais para o bem-estar de toda a família. Por isso, políticas públicas de suporte aos cuidadores and redes de apoio comunitárias são fundamentais.

O que é estresse tóxico?

O estresse faz parte da vida, e aprender a lidar com ele é essencial para o crescimento e desenvolvimento de bebês e crianças de zero a seis anos. Mas quando ele não dá trégua — é intenso, prolongado e sem o acolhimento adequado dos cuidadores — torna-se tóxico.

Existem três tipos principais de estresse. Há o estresse positivo, que é quando a criança vivencia uma experiência desafiadora e, junto com um cuidador responsável, consegue superá-la. Imagine o dia da vacina. A criança percebe o que vai acontecer: o corpo entra em alerta, a adrenalina é liberada, o coração acelera. É uma situação de estresse. Mas ela é imediatamente acolhida pelos cuidadores e o corpo rapidamente desacelera e tudo volta ao normal.

Essa reação espontânea é natural e necessária: ajuda a lidar com desafios e, quando bem administrada, apoia o desenvolvimento saudável e o bem-estar das crianças. É o que chamamos de estresse positivo. O mesmo ocorre em situações mais intensas, mas passageiras, quando existe acolhimento — como a chegada de um irmão, a perda de alguém querido ou a mudança de escola. Esse é o estresse tolerável, em que o cuidado do adulto amortece a dor e ajuda a criança a se recuperar.

O sinal fica vermelho em situações severas, como abusos ou negligências contínuas, especialmente quando não há um adulto protetor. Nesses casos, a resposta do corpo não se desliga e o organismo permanece em alerta.

Essa ativação constante sobrecarrega sistemas em desenvolvimento, trazendo consequências sérias e duradouras. É o que chamamos de estresse tóxico. Quando os sistemas de resposta ao estresse são ativados, ocorrem diversas reações fisiológicas. Entre elas, o aumento de frequência cardíaca e a liberação de hormônios relacionados ao estresse.

Quando apoiados por adultos responsáveis, bebês e crianças têm um tempo menor de resposta para esses cenários, o que desenvolve nelas respostas protetoras ao estresse. 

Estresse tóxico na primeira infância 

Quando bebês e crianças não recebem os devidos cuidados e suporte em casos de estresse tolerável, esses quadros podem escalar para cenários mais graves, desenvolvendo o estresse tóxico

The Sociedade Brasileira de Pediatria destaca que quanto mais tóxico o estresse, maiores os riscos de consequências graves a curto, médio e longo prazo. Esse tipo de estresse promove mudanças na arquitetura cerebral, causando redução de volume, disfunção dos sistemas neuroendócrino e límbico e até afetando a neuroplasticidade funcional. 

Esse tipo de estresse se desenvolve quando bebês e crianças são expostos a situações muito desafiadoras, sem que haja uma rápida resposta de acolhimento a elas. Conflitos familiares, abuso, pobreza, racismo e ausência de apoio acolhedor mantêm a criança em estado de “luta ou fuga”, com cortisol e adrenalina elevados de forma constante. Quando esse estado é prolongado, pode afetar a memória, a aprendizagem, a regulação emocional, a autoestima e até a capacidade produtiva no futuro.

Saúde mental dos cuidadores

O estresse tóxico também compromete a saúde dos adultos. E cuidadores sobrecarregados tendem a transmitir estresse às crianças. Situações adversas, como perda de emprego, pobreza ou falta de moradia, podem afetar a saúde mental dos adultos responsáveis e reduzir sua aptidão para apoiar as crianças no manejo de suas emoções.  

Por isso, apoiar também a saúde mental dos adultos é essencial para o pleno desenvolvimento infantil. Programas de suporte às famílias, promoção da parentalidade positiva, acesso à saúde e à educação de qualidade com equidade são pilares fundamentais para reduzir os efeitos do estresse na primeira infância, período decisivo do desenvolvimento humano.

É preciso priorizar a elaboração de políticas públicas centradas no cuidado para garantir que os adultos responsáveis terão apoio necessário para lidar com situações de vulnerabilidade, mitigando os possíveis efeitos em bebês e crianças pequenas.

Setembro Amarelo: cuidar da saúde mental na primeira infância

A saúde mental de bebês e crianças é um assunto sério e requer atenção contínua. O estresse tóxico pode tornar a criança irritada, apática e, a longo prazo, dificultar que aprenda, crie vínculos ou se sinta parte da sociedade. Mas isso não é determinante. Garantir ambientes estáveis, acolhedores e estimulantes — sobretudo na primeira infância — faz toda a diferença.

Precisamos proteger as crianças de toda e qualquer forma de negligência ou abuso, seja físico, sexual, emocional ou racial. Toda criança tem direito a um começo de vida tranquilo, com espaço para ser criança. Cada gesto de cuidado dos adultos fortalece o desenvolvimento infantil, previne o estresse tóxico e promove saúde mental.

Share